domingo, 31 de agosto de 2008

Um "nice dream" tornando-se realidade?*


Que o sonho agradável de assistir a um show do Radiohead ao vivo e em cores ano que vem deixe de ser um sonho apenas.
Há quem confirme na internet que em março a banda estará em terras brasileiras fazendo shows. Será? Será? Será?

Putz! Graças à maravilhosa tecnologia chamada internet pude assistir em tempo real ao webcast do último show da turnê do álbum In Rainbows nos Estados Unidos, que aconteceu em Santa Bárbara/Califórnia, dia 28/8. Fiquei com vontade de chorar de emoção (sem hipérboles!). Foram 25 músicas em duas horas de show!!! O setlist foi perfeito. In Rainbows em peso, claro... muito Kid A (enceraram com Idioteque! Simplesmente ma-ra-vi-lho-so!). Tocaram Paranoid Android do Ok Computer, nem acreditei!

Fui dormir feliz, mesmo sabendo que no outro dia seria uma zumbi ambulante... uma zumbi feliz, decerto (era 2h da manhã de 29/8 quando o show acabou... algo chamado fuso horário no meio do caminho). Só fez dar água na boca... Agora é torcer para que a vinda deles seja verdade e, lógico, eu possa ir (já que provavelmente Brasília não estará no roteiro)...

* Nice dream, Radiohead no album The Bends (1995)

terça-feira, 26 de agosto de 2008

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Amélie Poulain e eu


Não sei por que, mas me identifiquei de imediato com a Amélie Poulain (Audrey Tautou) assim que assisti ao Fabuloso Destino... no cinema anos atrás. Talvez porque nunca fui o mais sociável do seres, principalmente na adolescência, o que, de certa forma, fez com que eu criasse um mundo muito meu. Assim como Amélie, sempre tive uma imaginação para além do que me era dado pela realidade.

Amélie é um ser que inicialmente é bastante arredio, provavelmente pela falta de prática (leia-se “medo”) de se relacionar com as pessoas. Aos poucos, ela parte de uma vida que seria apática para uma vida na qual decide ser o instrumento para a felicidade alheia. E por um bom tempo acha que esse tipo de altruísmo é o bastante para sua própria felicidade. É preciso que amigos a façam enxergar que a condição de se ser feliz depende muito do permitir-se ser feliz por si mesma e não apenas através das outras pessoas. É então quando depois de muita resistência ela se entrega à sua paixão por Nino Quincampoix (Mathieu Kassovitz) e parece terminar o filme vivendo a felicidade em sua essência.

A cada dia eu me descubro um pouco mais, mesmo em meio a tantos pensamentos desencontrados sobre tantos assuntos diferentes entre si. Ou mesmo me redescubro, o que é satisfatoriamente prazeroso. “Permitir-se” é um longo processo que exige reformulações de idéias o tempo todo. Ainda bem (mesmo que às vezes seja doloroso!). E sigo indo a passos singelos ("para evitar a fatiga", diria o Jaiminho do Chaves). Acredito muito mais nos detalhes do que em grandiosidades. Acho que agora só falta meu Nino Quincampoix.

ainda tentando sobreviver ao caos

Eu deveria estar estudando matérias terrivelmente contrárias ao que me faz uma pessoa mais feliz, mas não consigo. E, por consequência, sinto-me culpada. Por isso tenho me sentido mais triste ultimamente, entre o “dever” e o “querer”. Tantos livros belos para serem lidos, tantos filmes maravilhosos para serem vistos, tantas músicas fundamentais para serem escutadas... luto constante e fortemente contra a minha falta de concentração diante de tantas coisas benéficas à alma e ao coração. E tudo isso segue ao som do implacável tic-tac do relógio. Daqui a pouco terei mais de 30 anos (se assim o quiserem!) e serei o reflexo das minhas escolhas de agora. Que caminho seguir? Que escolhas fazer? Seria uma crise dos quase 30? Talvez. A verdade é que nunca me senti totalmente imune a crises. Talvez apenas na infância, quando o futuro, de tão distante e ideal, parecia um sonho. Quando somos jogamos no mundo real, do dinheiro, do trabalho, nem sempre há beleza ou simplicidade. Pelo menos não aparentes. Por isso, muitas vezes, quase choro (sem figuras de linguagem!) quando, saindo do trabalho, vejo o sol se pôr no maravilhoso céu de Brasília com a voz de Nina Simone tocando no carro. Por alguma razão, isso me faz lembrar de uma beleza irrecuperável que está sendo perdida e então mais um dia se acaba. Como já ouvi de amigos, “mais um passo para o irremediável fim”.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o
convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto
Fernandes
que não tinha entrado na história.
("Quadrilha" – Carlos Drummond de Andrade)


Uma forma descontraída de ver os desencontros amorosos. Pena que na vida real não pareça tão engraçadinho assim... Pelo menos a poesia colore a vida.
Ultimamente tenho ouvido muito The Smiths. Sempre faz sentido. Poucos conseguem traduzir com tanta veracidade as agruras do coração.



The Boy With The Thorn In His Side (1985)

tentando sobreviver ao caos

Não, hoje não quero um choro público. Choro comigo mesma um choro silencioso. Prefiro isso a me expor para pessoas que pouco ou nada entenderiam. Resigno-me mais uma vez ao meu medo de ousadias. Ainda que não queira, fico com o que devo fazer. E não faço o que gostaria, embora deseje fazê-lo. Pareço estar presa a um círculo, daí a sensação de estar sempre no mesmo lugar. Tenho me sentido platéia de mim mesma. Fecho os olhos e sonho que levanto da poltrona, corro até o palco, desnudo a protagonista que ali está em pé, visto suas roupas e acho-me tão íntima da personagem que me permito arriscar alguns improvisos. A quem de fato cabe esse papel? Abro os olhos e chego a conclusão de que mesmo que tudo acabasse amanhã, o já aparentemente sem sentido restaria ainda mais sem sentido. Como explicar tanto caos, talvez mais imaginário que real?

domingo, 3 de agosto de 2008

Tema de "Amor à flor da pele", de Wong Kar-Wai

Belíssimo tema do igualmente belo "Amor à flor da pele" (In the mood for love, 2000), de Wong Kar-Wai.

Yumenji's Theme, de Shigeru Umebayashi



Curiosidade: essa música é originalmente da trilha sonora de um filme chamado Yumeji (1991), do diretor japonês Seijun Suzuki, que ainda não assisti.

Além disso, há uma versão em gaita, tocada por Chikara Tsuzuki, e está no muito bom "Um beijo roubado" (My blueberry nights, 2007), também dirigido por Wong Kar-Wai.

sábado, 19 de julho de 2008

Nada como assistir a uma comédia romântica francesa com uma grande amiga num sábado à tarde e depois, tomando um cappuccino, jogar conversa fora sobre os sabores e dissabores da vida...

quinta-feira, 17 de julho de 2008

rascunho...

Sinto-me ausente de mim mesma.
Essa voz não é minha.
Esse gesto não é meu.

Sinto-me o outro que me olha.
Uma estranha visitante sem data para partir.
Um enigma que se recusa a ser decifrado.

Sinto-me todos e ninguém.
Um salão de festas depois do baile.
Uma despedida depois do beijo.

Sinto-me repleta de eus e não-eus.
Suas dúvidas são minhas.
Seus medos são meus.

Tatá Ninômia

domingo, 13 de julho de 2008

Dead Poets Society (1989)

John Keating (Robin Williams): We don't read and write poetry because it's cute. We read and write poetry because we are members of the human race. And the human race is filled with passion. And medicine, law, business, engineering, these are noble pursuits and necessary to sustain life. But poetry, beauty, romance, love, these are what we stay alive for. To quote from Whitman, "O me! O life!... of the questions of these recurring; of the endless trains of the faithless... of cities filled with the foolish; what good amid these, O me, O life? Answer. That you are here - that life exists, and identity; that the powerful play goes on and you may contribute a verse. That the powerful play goes on and you may contribute a verse". What will your verse be?



quinta-feira, 19 de junho de 2008

...

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
(Álvaro de Campos - Tabacaria)

segunda-feira, 26 de maio de 2008

pontos de interrogação

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
(Álvaro de Campos/Tabacaria)

Então me diz qual é a graça
De já saber o fim da estrada,
Quando se parte rumo ao nada?
(Paulinho Moska/A seta e o alvo)

Diariamente, incesantemente, travo verdadeiros diálogos comigo mesma. Seria isto normal? Seria eu uma pessoa normal?

O que é ser uma pessoa normal? Quais são os atributos que definem esse tipo de pessoa? Afinal de contas, pessoas normais existem?

Olhando o dicionário Aurélio podemos achar:

Normal. [Do lat. normale] Adj. 2 g. 1. Que é segundo a norma. 2. Habitual, natural.

O que nos remete a

Norma. [Do lat. norma] S.f. 1. Aquilo que se estabelece como base ou medida para a realização ou a avaliação de alguma coisa [...]. 2. Princípio, preceito, regra, lei [...]. 3. Modelo, padrão.

Ou ainda a

Habitual [Do lat. med. habituale] Adj. 2. g. 1. Que se faz, ou que sucede, por hábito. 2. Comum, vulgar. 3. Freqüente, usual.

Não sei como funciona a cabeça das outras pessoas. Só sei que comigo é assim: sempre pensando... Dentro do normal ou não, o fato é que a situação piora nos períodos que circundam a data do meu nascimento. Daqui algumas semanas completo mais um ano desde que cheguei a este mundo. Não me incomoda o fato de ficar mais velha. O processo de envelhecimento em si é interessante (ainda que o tic-tac do relógio me intimide algumas vezes!). O que ocupa grande parte dos meus dias é me perder em pensamentos intermináveis sobre todos esses anos e tentar responder questões que podem se resumir num simples “quem sou eu?”. Bem, não tão simples assim. Poderia, de uma forma sucinta e superficial, dizer: brasileira, natural de Brasília, nascida em 1980, filha de uma paulistana e de um carioca, teve uma infância feliz, uma adolescência nada rebelde, e ainda vive seus 20 e poucos anos cercada por interrogações. A idéia de tudo isso me define em parte, é verdade. Serve como mote para uma longa conversa.

Agrega-se a esse breve início o que é dito sobre as pessoas nascidas sob o signo de Câncer. Não sou uma crente incondicional das forças dos Astros. Entretanto não posso negar uma coincidência intrigante entre os elementos que caracterizam os cancerianos de um modo geral e minha personalidade. As estrelas revelam que aqueles nascidos entre 22/junho e 22/julho são sensíveis, sentimentais, sensatos, solícitos e vivem em busca do tempo perdido, sempre saudosos de um tempo passado, conservadores, refratários a mudanças, prezam pela segurança e mudam de humor como quem muda de roupa. De fato tudo isso também me compõe. Choro assistindo comercial na televisão, não suporto uma voz mais áspera, estou sempre pronta para escutar os problemas dos outros, tenho o meu conservadorismo, mudar é como um parto, o passado me visita quase diariamente – seja para me alimentar com uma saudade saudável, seja para me atormentar com possibilidades perdidas quando um “sim” deveria ter sido um “não” ou vice-versa –, posso acordar sob um céu ensolarado, amando tudo e todos ao meu redor, distribuindo risos de bom humor, e terminar o dia sob um céu acinzentado, odiando tudo e todos, recolhida a mim mesma.

Sou os livros que leio, as músicas que escuto, os filmes que assisto, sejam bons ou ruins, tudo convergindo para a construção do meu mundo e da minha visão sobre o nosso Mundo. Sou os amigos de ontem que passaram pela minha vida e sou aqueles de agora que nela estão, sou meu pai, sou minha mãe, sou meu irmão, sou minha tia-mãe, sou minha beagle e as que a antecederam, sou meus professores, sou meus antepassados brasileiros, africanos, europeus e japoneses ou qualquer um outro que eu desconheça, sou a crença que não é mais, sou a amálgama de tudo isso e um pouco além, sou um poço de contradições, sou alguém que está sendo e que se encanta e se perde na incógnita chamada vida.

Sinto vontade de abraçar o mundo (há tanto para ser explorado, descoberto, experimentado!) e ao mesmo tempo sinto-me frustrada por não conseguir fazê-lo (pelo menos não na velocidade que gostaria!). Sinto-me nada diante de tantas perguntas num caminho sem rumo. Para onde irei? Quais escolhas a serem feitas? (A idéia do que não quero ser se apresenta mais nítida para mim do que aquela que ilustra o contrário.) Perco-me nessas interrogações, sofrendo por antecipação, ansiedade que não se afasta de mim.

E de repente todas essas perguntas perdem o porquê de existir (se é que possuem sentido) e tornam-se insignificantes (se é que possuem significância alguma) diante de tantos eventos terrenos e espaciais ocorrendo simultaneamente. Quem sou eu? Sim, única dentre bilhões, mas também apenas uma dentre esses bilhões.

Olho-me no espelho e vejo uma pessoa. Confusa? Definitivamente. Normal? Não sei. Talvez. (Adequar-se ao padrão me parece monótono.) E ao final do dia fico feliz em acreditar que há perguntas que são feitas para não serem respondidas, mas constituem a razão de uma infindável busca. Provavelmente reside aí grande parte da graça da vida.

sábado, 3 de maio de 2008

Um dos melhores finais (spoiler)

Annie Hall (1977), de Woody Allen.



Yes, we need the eggs.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Pra não dizer que não postei

Diante da correria do mundo e da vida, paro para apreciar um vídeo simples sem grandes pretensões ou poder de mudança. Apenas pelo prazer de ver e ouvir jovens cantando Care of Cell 45 de The Zombies e Starman de David Bowie pelas ruas de Paris (segundo o próprio vídeo). Uma delícia!

sábado, 12 de abril de 2008


Às vezes demoramos a perceber a necessidade de nos desgarrar de determinada situação que julgamos ser a melhor que poderíamos viver. E, achando que não podemos viver de outro modo, não só lamentamos o seu fim como nos vemos incapazes de seguir em frente. E dar o primeiro passo para a mudança pode parecer ser impossível, mesmo que dependa apenas de nós mesmos. Mas quando nos permitimos mudar, quando partimos em direção a outros rumos, há uma agradável possibilidade de, num processo de auto-conhecimento, depararmos com um mundo novo que surge a partir de nós mesmos e se desvela à nossa frente – ainda que o ambiente externo faça sua parte. Não é fantástico podermos, pelo incessante movimento destruição-construção-destruição-construção, nos tornar pessoas melhores ao longo da nossa caminhada?

Wong Kar-Wai me fez pensar nisso tudo com seu My Blueberry Nights, ou Um Beijo Roubado, que estreou na última sexta-feira nos cinemas. Estréia do cineasta chinês no cinema norte-americano, estréia da jazzista Norah Jonas como atriz, o filme encanta pela simplicidade, pela bela fotografia, pelos inusitados planos, por suas cores, pela delicada trilha sonora, pelos deliciosos diálogos... e, claro, por um Jude Law mais lindo do que nunca.

Monty Python - the best nonsense




Uma das melhores cenas de "Monty Python and the Holy Grail"... Bruxas, assim como as madeiras, são queimadas na fogueira. Então bruxa = madeira. Se são feitas de madeira, devem boiar na água. Se bóiam na água, têm o mesmo peso de um pato, que também "bóia". Então claro que ela é bruxa por ter o mesmo peso do pato, boiar e, conseqüentemente, ser de madeira... isso é tão óbvio, não? hehehe...

segunda-feira, 31 de março de 2008

...

Tento agarrar-me aos detalhes capazes (penso!) de responder os porquês. E assim sigo solta na negritude infinita pontilhada com estrelas que já foram ou deixarão de ser.

Será que sou? Definitivamente, estou.

domingo, 30 de março de 2008

O princípio do fim



Wakey wakey
rise and shine
it's on again, off again, on again
watch me fall
like dominos
in pretty patterns
fingers in the blackbird pie
I'm tingling, tingling, tingling
it's what you feel now
what you ought to, what you ought to
reasonable and sensible
dead from the neck up
because I'm stuffed, stuffed, stuffed
we thought you had it in you
but no, no, no
for no real reason

Squeeze the tubes and empty bottles
and take a bow, take a bow, take a bow
it's what you feel now
what you ought to, what you ought to
the elephant that's in the room is
tumbling, tumbling, tumbling
in duplicate and triplicate and
plastic bags and
duplicate and triplicate
dead from the neck up
I guess I'm stuffed, stuffed, stuffed
we thought you had it in you
but no, no, no
exactly where do you get off
is enough, is enough
I love you but enough is enough, enough
a last stop
there's no real reason

You've got a head full of feathers
you got melted to butter

(Faust Arp - Radiohead)

domingo, 23 de março de 2008

Da janela do meu quarto

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
(Álvaro de Campos, Tabacaria)

sábado, 22 de março de 2008

A última postagem me fez lembrar...

Hello Goodbye, dos Beatles! Claro!


Desencontros lingüísticos

Desencontro lingüístico I (versão franco-alemã)

– Ich liebe Dich!
– Je ne t’aime pas encore.
– Du bist das Licht meines Lebens!
– "Nous" n’exist pas encore.
– Sei du meine Eherfrau!
– Demain je partirai.

xxx

Desencontro lingüístico II (versão anglo-portuguesa)

– I love you!
– Eu não te amo mais.
– You’re the light of my life!
– “Nós” não existe mais.
– Be my wife!
– Amanhã estou indo embora.

sexta-feira, 21 de março de 2008

Segredos

Ela abriu os olhos. O silêncio estava por toda parte. Apenas um pequeno relance de luz matinal insistia em querer transbordar para além da janela cortinada. Mais um dia, pensou. Seus olhos percorreram seu redor sem que o corpo os acompanhasse. Até que encontraram um homem que dormia pacificamente ao seu lado. Quantos dias, pensou. Um homem com quem dividira tantas luas e tantos sóis. Poderia dizer que o conhecia minuciosamente e, no entanto, sabia que seria capaz de se perder num labirinto infinito de possibilidades que habitavam aquele ser finito. Possibilidades essas que nunca chegariam à superfície, permaneceriam recônditas numa imensa escuridão. Preparou-se para levantar, mas o peso de toda uma vida não o permitiu. De repente uma lembrança perdida na infância veio à tona e de tão nítida a fez crer em viagens no tempo. Lembrou-se de quando, subindo numa árvore, no sítio de seus avós, apanhava jaboticaba. Como tudo àquela época era simples, lembrou. E naquele quarto agora estava. Sentia-se esposa, sentia-se mãe, sentia-se avó e tudo isso o era. E talvez quisesse que não fosse nada disso. Casou-se ainda menina, sem muita escolha, sem muito amor. Porque no tempo de sua juventude se casava. Era o costume. É para sua segurança, dizia sua mãe. E assim se uniu a um homem do qual pouco conhecia. Sabia apenas que trabalhava com números e nutria um sentimento especial por gravatas. Presa à sua rotina, por vezes tentava imaginar como estaria vivendo seu eu que tomou um outro caminho. Quais seriam seus sonhos, seus anseios, suas desilusões. Seria feliz? Meus filhos são saudáveis, agradeceu, e voltou a coser os shorts de brincar das crianças. Os anos passaram num ritmo lento e ali agora estava, deitada na cama. Conseguiu se levantar e já no banheiro, diante do espelho, viu alguém que não reconhecia. De repente sentiu doer uma dor intensa e singelas lágrimas irromperam sem pedir licença. Saudade do que poderia ter sido e não foi, e ainda assim talvez não quisesse que o fosse. Simplesmente uma curiosidade de querer saber como tudo poderia ter sido diferente. Teria sido feliz? Mas não seria felicidade ter filhos e netos saudáveis, questionou a si mesma. Recompôs-se. Este será mais um dia. Um pouco além de um dia apenas. Completa bodas. Será parabenizada, ganhará presentes, abraços e beijos. No final do dia continuarão desconhecendo seus segredos.

quinta-feira, 20 de março de 2008

Simply Wonderful

Nina Simone - Ain't Got No...I've Got Life

Trancoso (BA) num dia preto-e-branco

Janeiro/2008
(simples experimento com a câmera )

terça-feira, 18 de março de 2008

Por que Metafísica do Chocolate?

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
[Trecho de Tabacaria – Álvaro de Campos]

Como não se extasiar diante do poema Tabacaria, escrito em 1928 por Álvaro de Campos/Fernando Pessoa? Não me lembro exatamente em que ocasião o li pela primeira vez. (Sei que faz um bom tempo!). O certo é que desde então não consigo parar de lê-lo e cada nova leitura traz uma outra descoberta. Quem somos, para onde vamos, nossa pequenez diante do Infinito, o desencanto diante de perguntas sem respostas, o jogo de (ir)realidades... todas as questões que estão para além do plano material e que ao mesmo tempo estão impregnadas com o concreto do cotidiano reverberam ao longo o poema. Não cabe aqui uma análise literária minuciosa que poderia trazer, por exemplo, Gaston Bachelard e seu conceito de devaneio poético. O que extraio aqui, e peço licença para pegar emprestado do poeta, é a imagem da metafísica do chocolate. Às vezes o que é ou parece grandioso ou indecifrável revela-se no que há de mais simples e prosaico. E mesmo assim, por partir do princípio de que tudo é complicado, ou supostamente deveria ser, não aproveitamos a simplicidade do momento. A eterna mania humana (em especial os adultos) de complicar as coisas! [Uma leitura pessoal].
Ainda não sei se no blog cabe o título ou se no título cabe o blog. Difícil prever o desenrolar das pedras. De qualquer forma, está aí muito do que me faz devanear: Fernando Pessoa, Tabacaria, e, claro, chocolate, que em seu sentido denotativo e deliciosamente real faz surgir, prazerosamente, as mais agradáveis sensações.

primeiras palavras

Recomeçar é estimulante. Acredito em novos ares. Um grande amigo, certa vez, fez uma observação curiosa sobre um blog meu, anterior a este, que de alguma forma ficou no meu inconsciente e agora se revela de um modo libertador. Ele cobrava, a meu ver, talvez palavras mais pessoais, que pudessem desvelar um pouco mais quem sou eu. Não sei, pode ser uma interpretação subjetiva demais da conversa. Seja como for, decidi recomeçar de uma forma diferente, em outro endereço, com outra perspectiva, num tom menos “resenhista” (se possível!).
De repente sinto uma necessidade desenfreada de me expor e me desnudar por palavras de um jeito que até então não ousaria. (E talvez ainda não ouse, apenas sinta a necessidade!). Ainda não sei o que me levou, ou melhor, trouxe, a esse turbilhão de sentimentos que já existiam latentemente. Talvez seja uma ótima saída para economizar alguns trocados que iriam para o analista.
Mas afinal de contas, qual é a razão de se ter um blog? Devanear, tornar público nossos mais loucos e íntimos pensamentos, liberar o lado escritor que potencialmente possuímos ou simplesmente mostrar o quão comuns somos? Escrever sobre o quê? Sobre filmes, livros, músicas, cores, cheiros, pessoas... tudo que nos causa sensações e aguça sentimentos e, inevitavelmente, nos compele a exteriorizar nosso modo de ver o mundo? Talvez.
Nada que aqui estiver escrito por mim vai mudar o mundo, trazer paz à humanidade, ou refrear o irremediável fim da nossa civilização. Antes são inquietudes de um microcosmo singular, o meu, sem grandes pretensões nem ambições, as quais escrevo para mim. Se, porventura, alguém quiser conhecer um pouco desse mundo, sinta-se à vontade e puxe uma cadeira.